quinta-feira, 4 de março de 2010

EWÁ


I

Ewá era uma linda mulher que morava num reino distante de Ifé. Com seu jeito de princesa, causava admiração por onde passava. Vivia nas margens de um rio e podia invocar as forças dos ventos e das chuvas para favorecer as colheitas. Um dia, quando se banhava no rio, um arco-íris se formou diante dela. A imensidão da luz impressionou Ewá, a qual sentiu que alguém a protegia e envolvia. Correu para contar aos outros habitantes da região o que presenciara, mas, assim que deixou a água, olhou para trás e viu que o arco-íris desaparecera, restando apenas algumas moedas no local.

No outro dia, a cena se repetiu. Ela seguiu então em direção ao rio para ver onde terminava o arco-íris. Nadou por três dias e três noites, até chegar à outra ponta. Lá havia uma coroa de ouro, que Ewá, cheia da curiosidade, tomou nas mãos. Então Oxumaré, o orixá da riqueza, apareceu diante dela, dizendo-se encantado com sua beleza. Ewá se apaixonou pelo deus e pediu-lhe que a transformasse num orixá. Assim transformou-se numa cobra, vivendo para sempre com Oxumaré.

II

Na Nigéria, Abimbola publicou um itan Ifá (história de Ifá), falando que de certa feita, estando Yewá à beira do rio, com um igbá (gamela) cheio de roupa para lavar, avistou de longe um homem que vinha correndo em sua direção. Era Ifá que vinha esbaforido fugindo de iku (a morte). Pedindo seu auxílio, Yewá despejou toda a roupa no chão, que se encontrava no igbá, emborcou-o em cima de Ifá e sentou-se. Daí a pouco chega a morte perguntando se não viu passar por ali um homem e dava a descrição. Yewá respondeu que viu, mas que ele havia descido rio abaixo e a morte seguiu no seu encalço. Ao desaparecer, Ifá saiu debaixo do igbá e levou-a para sua, a fim de tornar-se sua mulher.



III

Depois do nascimento de Omolu, Nanan teve dois filhos gêmeos. Um deles é Oxumaré; o outro é Ewá. De acordo com a maldição que caiu sobre Nanan, Oxumaré se tornou a serpente do arco-íris, ficando com todas as cores; para Euá restou o branco e por isso ela ficou governando a chuva que provoca as enchentes e a lua cheia que faz com que as chuvas sejam mais fortes. Mas ela ficou livre da maldição e, por isso, é o Orixá da beleza e da alegria.

IV

Yabá serena e misteriosa é a senhora da intuição, comunicação e fertilidade. Ela foi perseguida na terra devido à sua forma (metade mulher metade serpente) e seu poder de fertilidade. Oxum deu-lhe a gruta de presente como moradia, em troca Ewá, como não podia ter filhos, deu a fertilidade a todas as mulheres e a intuição à Oxum.

Euá (do iorubá Ewá) é a deusa encarregada de encaminhar os espíritos para reencarnação.

Filha de Nanã com Oxalá, irmã gêmea de Oxumaré, tem também como irmãos Ossayn e Omulu.

Protetora de todas as mulheres com dificuldades de engravidar e estéreis, das pessoas com deficiências e de todas as pessoas descriminadas.

V

Conta uma lenda, que Yewá era esposa de Omulu, e era estéril, não podendo conceder um filho ao seu grande amado, sofrendo muito por isso.

Numa bela tarde, a dona dos horizontes, estava a deleitar-se nas margens de um rio, juntamente com as suas serviçais que lavavam vários Alás (panos brancos). De repente, surge de dentro da floresta a figura de uma pessoa, que corria muito e muito assustado.
- Como ousas interromper o deleite da mulher de Omulu? Quem é você? - indagou Yewá, sobre a irreverência do rapaz.

- Ewa! Não era minha intenção interromper tão sagrado ato, oh esposa de Omulu! Porém Ikú (a morte), persegue-me há vários dias e preciso escapar dela, pois tenho ainda um grande destino a seguir. Peço sua ajuda Yewá, peço que me escondas para que Ikú não me pegue?!

- Gostei de você e vou ajudá-lo. Esconda-se sob os Alás que minhas serviçais estão a lavar, e eu despistarei Ikú de seu caminho.

E assim foi feito. O jovem rapaz enfiou-se sob os panos brancos, a esconder-se de Ikú.
Alguns minutos se passaram, e eis que aparece Ikú. A morte!

- Como ousas adentrar nos domínios de minha morada? Quem es tú? - pergunta Ewa com ar de indignada.

- Sou Ikú, e entro onde as pessoas menos esperam, entro e carrego comigo, dezenas, centenas e até milhares de pessoas! Porém hoje estou a procurar um jovem rapaz, que está a escapar-me há dias. Você o viu passar por aqui? - perguntou Ikú para Yewá.

- Eu o vi sim Ikú, ele foi naquela direção. - Ewá apontava para uma direção totalmente oposta ao das suas aldeãs, que estavam a esconder o jovem rapaz.
Ikú agradeceu e seguiu pelo caminho indicado.

Sendo assim, o rapaz pode sair do seu esconderijo e agradeceu a Yewá.
- Ewa, agradeço sua ajuda, terei tempo agora, de prosseguir meu caminho. Sou um grande adivinho, e em sinal de minha gratidão, a partir de hoje presenteio-lhe com o dom da adivinhação.

Ewa, agradeceu o presente dado pelo rapaz, que já havia se virado para ir embora, quando retornou e falou a Yewá:

- Sim eu sei, você não pode ter filhos, pois lhe dou isso também. A partir de hoje, poderá ter filhos e alegrar ao seu marido.

Então Yewá agradeceu novamente muito contente e perguntou ao jovem rapaz:

· Qual é seu nome?

E o rapaz respondeu:

- Meu nome é Ifá!

VI

Ewá é virgem, bela e iluminada. Apesar desta beleza e do assédio dos orixás masculinos, nunca quis se casar, sendo uma moça quieta e isolada, voltada para o conhecimento dos segredos das transformações.

Nanã, preocupada com sua filha, pediu a Orunmilá que lhe arranjasse um amor, um casamento, mas Ewá desejava viver sozinha, dedicada à sua tarefa de fazer cair a noite no horizonte, puxando o sol com seu arpão.

Como Nanã insistisse em seu casamento, Ewá pediu ajuda a seu irmão Oxumarê, o arco-íris, que a escondeu no lugar onde ele se acaba, por trás do horizonte, e Nanã não mais pôde alcançá-la. Assim, os dois irmãos passaram a viver juntos, para sempre inatingíveis. Ambos regem o intangível e Ewá também é compreendida como a energia que torna possível o abandono do corpo e a entrada do espírito numa nova dimensão.

No Brasil poucos candomblés cultuam Ewá, pois dizem que o conhecimento sobre as folhas necessárias ao seu culto foi perdido durante o processo de aculturação dos africanos escravos.

VII

ITAN TI ÌYÉWÁ

Ìyéwá é filha de Nanan, irmã de Obaluaiye, Osanyin e gêmea de Oxumarê. Apesar de gêmea, foi a segunda a nascer sendo, assim, a caçula dos filhos de Nanan. Cada um dos filhos regia algo; Obaluaiye, as pestes e moléstias contagiosas; Osanyin, as ervas e as plantas e seus segredos e mistérios; Oxumarê, o arco-íris e a riqueza.

Ìyéwá nada regia. Era apenas uma menininha bonita, formosa, cheia de encantos. E assim cresceu, bela e de brilho intenso. Pouco a pouco, os homens foram se interessando por ela, tal era a sua beleza. Muitos pretendentes chegaram, de todas as partes, com a intenção de desposar Ìyéwá, pois sua beleza era tão grande que sua fama chegou a todos os reinos.

Em pouco tempo o reino de Nanan estava cheio de supostos noivos que lutavam entre si para conquistar o coração da jovem Ìyéwá. As lutas foram crescendo e tomando proporções, a ponto de, em cada canto do reino, haver um grupo de luta, com um só objetivo: desposar Ìyéwá. Isso tudo fugiu ao controle de todos, pois o encanto da jovem parecia enfeitiçar os homens, a ponto de matarem-se uns aos outros.

A situação já passara dos limites e os pretendentes, que não paravam de chegar, foram até à própria Ìyéwá, obrigando-a a escolher um deles. Isto acontecia aos gritos, empurrões, exibições de força e poder, cobranças violentas, barulho, levando a jovem a um desespero que jamais sentira.

A pressão foi tão grande, mas tão grande que, de repente, ouviu-se um grande estrondo. Todos se calaram, voltando-se para Ìyéwá e ficaram imóveis, estáticos, e de olhos arregalados com o que estavam vendo.

Ìyéwá, impossibilitada de escolher um noivo, e atormentada por ver tanta morte e confusão por sua causa, começou a se transformar. Como um reflexo do sol, sua silhueta começou a perder a forma, até que restou apenas uma poça d’água no chão. Aos poucos, aquela poça foi evaporando e subindo em direção ao céu. Os homens pretendentes, não se moviam, só acompanhavam a evaporação, bem visível e o vapor subindo.

Em pouco tempo uma enorme nuvem branca, contrastando com o azul-claro do céu, foi desenhando um coração, numa visão de raríssima beleza. Ìyéwá não se casou com ninguém, mas colocou na mente dos homens que o amor nasce naturalmente, não com disputas e guerras. Assim Ìyéwá transformou-se e recebeu o poder de ir ao céu, como nuvem e voltar à terra, permanecendo como o símbolo da beleza, do canto e da alegria.

VIII

Corre a lenda entre as casas antigas da Bahia que cultuam Yewá, que certa vez indo para o rio lavar roupa, ao acabar, estendeu-a para secar. Nesse espaço veio a galinha e ciscou, com os pés, toda sujeira que se encontrava no local, para cima da roupa lavada, tendo Yewá que tornar a lavar tudo de novo. Enraivecida, amaldiçoou a galinha, dizendo que daquele dia em diante haveria de ficar com os pés espalmados e que nem ela nem seus filhos haveriam de comê-la, daí, durante os rituais de Yewá, galinha não passar nem pela porta. Verger encontrou esse ewo na África e uma lenda idêntica.